Séculos antes da invenção da primeira lâmpada, antes mesmo da
chegada dos portugueses, os povos indígenas que habitavam o território que hoje
chamamos de Brasil, utilizavam a luz do fogo e a claridade da Lua como forma de
iluminar suas noites. Além das fogueiras, não existe vestígios de outra forma
de iluminação artificial no Brasil pré-cabralino. O fogo era importante não
apenas para proporcionar iluminação, mas também era um importante recurso para
espantar animais selvagens, cozinhar alimentos e fornecer calor nas noites mais
frias. O fogo também era sagrado para muitos grupos, sendo utilizado em
cerimonias tradicionais e práticas religiosas.
O missionário e
escritor francês Jean de Léry (1534-1611) que junto com o almirante Villegagnon participou
da invasão do Rio de
Janeiro em 1557, deixou-nos uma vívida narrativa sobre o emprego
do fogo pelos índios brasileiros:
São os selvagens muito amigos do fogo e não pousam
em nenhum lugar sem acendê-lo, principalmente à noite, pois temem então ser
surpreendidos por Ayugnan, o espírito maligno, que, como já disse, amiúde os
espanca e atormenta. (LÉRY, 1980, p. 303)
Com os colonizadores europeus
chegam ao Brasil algumas formas de iluminação que já há muito tempo eram
utilizadas no velho mundo, mas que se constituíam uma novidade para os nativos
da América, como foi o caso das lamparinas, candeeiros e as velas. Tais
recursos funcionam à base de ceras e óleos vegetais ou
animal. O
óleo de oliva era um dos mais utilizados, mas, como era fabricado somente na Europa,
tinha altos custos, tornando sua utilização exclusiva da elite colonial. De
acordo com Ana Aver (2013), com o alto custo do óleo de oliva, rapidamente ele
foi substituído por outros óleos fabricados no Brasil, como o óleo de coco e principalmente
o de mamona (conhecido também como carrapateira).
Posteriormente,
surgiu óleos derivados de gordura animal (principalmente de baleias) e foram fabricadas
velas feitas de gorduras e de cera de abelha (produtos que em razão do alto
preço, também não eram utilizados nas residências da população pobre).
Já no Brasil Oitocentista, é interessante destacar
que nesta época popularizam-se os combustíveis fósseis. Estes combustíveis –
que mais tarde se tornariam fundamentais para muitos aspectos da vida nos séculos XX e XXI – tiveram
seu primeiro uso comercial girando em torno da luz. As novas lâmpadas á base destes combustíveis
(cujo principal era o querosene), possuíam claridade muito maior do que
qualquer vela jamais fora antes e tinham um valor muito mais acessível.
Acerca destas, cada vez mais populares lâmpadas, o
historiador norte-americano Steven Johnsson (2015), autor de importantes
pesquisas sobre o impacto histórico da tecnologia no cotidiano, afirma que sua
popularização impactou a civilização nas mais variadas áreas, inclusive no que
diz respeito à informação e a imprensa: “seu brilho mais intenso incentivou a
publicação de revistas e jornais da segunda metade do século XIX, já que as
horas escuras depois do trabalho tornaram-se cada vez mais compatíveis com a
leitura”.
Coincidentemente, nesse
período de crescente iluminação, surgiram vários jornais de influência no Brasil
oitocentista, como o carioca Diário do Rio
de Janeiro (1808); o pernambucano
Diário de Pernambuco (1825); e os paraibanos Jornal da Parahyba (1885)
e A União (1891).
É
interessante observar, que por outro lado, tais lâmpadas também provocaram
explosões literais: milhares de pessoas morriam a cada ano por incêndios
originados nas luzes de leitura. Apesar
dos avanços, a luz artificial ainda era algo muito limitado, e hábitos como ler
depois do anoitecer ainda era sinônimo de luxo.
Outro historiador norte-americano, Roger Ekirch,
destaca que até o século XIX, as noites eram tão opressivas que os cientistas
agora acreditam que até mesmo nossos antigos padrões de sono diferiam
radicalmente comparados aos padrões atuais sob influência da onipresente iluminação
noturna. Em 2001, Ekirch publicou um estudo notável, inspirado em centenas de
diários e manuais de instrução, argumentando, de forma convincente, que:
“Historicamente os seres humanos
dividiram suas longas noites em dois períodos de sono distintos. Quando a noite
caía, eles adormeciam para um “primeiro sono”, despertando após quatro horas
para fazer um lanche, fazer suas necessidades fisiológicas, ter relações
sexuais ou conversar junto ao fogo, antes de voltar para mais quatro horas de
“segundo sono”.(Apud, Johnson, 2015, p.113)
Ekirch,
em sua obra mais conhecida “At Day’s Close”, argumenta que os avanços tecnológicos
relacionados a iluminação artificial a partir do século XIX interrompeu esse
antigo ritmo, abrindo-se toda uma série de atividades modernas que podiam ser
realizadas depois do pôr do sol, variando de teatros e restaurantes até o
trabalho nas fábricas. Após anos de
investigação Ekirch defende que o processo de um único bloco de oito horas de
sono contínuo, que é o mais comum entre os citadinos do século XXI, foi desenvolvido por costumes do século XIX,
em adaptação a uma drástica mudança no ambiente iluminado dos assentamentos
humanos.
Referências Bibliográficas:
EKIRCH, Roger. At Day's Close: Night in
Times Past. New York: W. W. Norton & Company, 2006.
FURTADO, Peter. 1001 Dias que Abalaram o Mundo. Rio de Janeiro: Sextante, 2009.
JOHNSON, Steven. Como chegamos até
aqui: A história das inovações que fizeram a vida moderna possível. São
Paulo, Zahar, 2015.
LÉRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. São
Paulo, Editora da Universidade de São Paulo. 1980.
O texto acima é parte da monografia apresentada ao Curso de Licenciatura Plena em
História, do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal
da Paraíba, intitulada "A CHEGADA DA ENERGIA ELÉTRICA NA
CAPITAL PARAIBANA E SEU IMPACTO NO COTIDIANO DA POPULAÇÃO", de autoria de HELTON DE ASSIS FREITAS, editor deste blog.